Durante muito tempo, pelo menos até o final do século 19, a tradução foi usada como principal método de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras. O Grammar-Translation Method preconizava que a aquisição de uma língua estrangeira se dava pelo estudo detalhado de suas estruturas gramaticais e pela aplicação dessas estruturas em exercícios de tradução da e para a língua estrangeira.
No século 20, conforme o foco da aprendizagem de idiomas foi passando das habilidades de compreensão e produção escrita para as habilidades de compreensão e produção oral, surgiu um novo método de ensino de idiomas. O Direct Method se contrapunha diretamente ao uso, em situações de aprendizagem de uma língua estrangeira, tanto da língua materna do aprendiz quanto de exercícios de tradução.
Já em meados do século 20, o Direct Method passou a ser questionado, e muitas novas abordagens surgiram, como o Natural Approach e o Communicative Language Teaching (CLT). Essas novas abordagens preconizam o uso da língua estrangeira em situações de aprendizagem através de tarefas autênticas e interativas. A tradução, nessas abordagens, não é necessariamente proibida, mas também não é o foco, que é a proficiência na comunicação oral.
Nas abordagens que surgiram desde então, muitas delas como variações do próprio CLT, a tradução tem sido retomada, de formas diversas, como método de aprendizagem. Veja algumas das vantagens do uso da tradução como método de aprendizagem de idiomas:
Tradução como “scaffolding”
Mesmo em contextos comunicativos, a tradução pode ser usada para aproveitar os conhecimentos linguísticos prévios do aprendiz (sobre sua língua materna) para a aquisição de novos conhecimentos linguísticos (sobre a língua estrangeira). Essa técnica pode ser particularmente útil quando o aprendiz está no início da aquisição da língua estrangeira.
Tradução como análise contrastiva
Não só os aprendizes em níveis básicos têm a ganhar com a tradução pedagógica: mesmo entre aprendizes com conhecimentos avançados da língua estrangeira, a tradução pode ser usada para conscientizar o aprendiz dos contrastes entre os idiomas (língua materna e língua estrangeira), assim minimizando as interferências da língua materna na aquisição da língua estrangeira e muitas vezes até evitando fossilizações.
Tradução e aquisição de vocabulário
A tradução pedagógica também é uma ótima forma de promover a aquisição de vocabulário. Ao traduzir diferentes tipos de texto, o aprendiz faz uso de itens lexicais que, caso trabalhasse apenas em textos produzidos por si mesmo, talvez nunca viesse a aprender.
Tradução e competência instrumental
O uso de exercícios de tradução, mesmo em contextos comunicativos, pode ajudar a desenvolver a competência instrumental dos aprendizes, através do uso consciente de dicionários bilíngues, monolíngues e especializados, além de glossários e corpora. Isso contribui para ganhos linguísticos diversos, além de contribuir para a maior autonomia do aprendiz em seus estudos da língua estrangeira.
Tradução e plurilinguismo
No mundo globalizado, a comunicação multilíngue é uma realidade: cada vez mais, vemos a necessidade, inclusive no mundo profissional, de pessoas que saibam não só se comunicar em mais de um idioma, mas também mediar entre esses idiomas. O próprio Quando Comum Europeu de Referência para Línguas (CEFR), elaborado pelo Conselho da Europa, afirma que o objetivo do aprendiz de línguas estrangeiras deve ser o plurilinguismo e a intercultura. O aprendiz deve ser capaz de “mediate, through interpretation and translation, between speakers of the two languages”.
Tradução, a quinta habilidade!
Por muito tempo deixada de fora da sala de aula, na qual se trabalhavam “as quatro habilidades” (speaking, listening, reading e writing), a tradução pode ser vista como a quinta habilidade a ser desenvolvia. De acordo com Pym et al., a tradução é “a fifth skill to be practised within the language classroom, alongside reading, listening, speaking and writing in the two languages independently”. Assim, a aquisição de uma língua estrangeira, para além da fala, da escuta, da leitura e da escrita, também pode se dar pela tradução. Para Pym et al., “translation is somehow inherent in the language-learning process itself; […] it is a skill that is as fundamental to the bilingual mind as each of the other skills is to monolingual and bilingual minds alike. In this view, translation is a way (or set of ways) of learning a second or foreign language, and not just a way of training professional translators and interpreters”.
Referências
CALVO CAPILLA; RIDD. A tradução como atividade contrastava e de conscientização na aprendizagem de línguas próximas. Horizontes de linguística aplicada, v. 8, n. 2, p. 1501-69, 2009.
COUNCIL OF EUROPE. Common European Framework of Reference for Languages: Learning, Teaching, Assessment. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
PYM, Anthony; MALMKJAER, Kirsten; GUTIERREZ-COLON PLANA, Mar. Translation and language learning: the role of translation in the teaching of languages in the European Union. A study. Luxembourg: Publications Office of the European Union, 2013.
RICHARDS, J.; RODGERS, T. Approaches and methods in language teaching. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.
Uma boa dica para quem está estudando língua inglesa para o CACD é a coleção Tradução em Contexto, da editora Lexikos. O objetivo da coleção é apresentar ao leitor alguns contos de um mesmo autor, em inglês, acompanhados de sua contrapartida em português.
O texto fonte, em inglês, é apresentado nas páginas pares dos livros, enquanto o texto de chegada, em português, é apresentado nas páginas ímpares dos livros, o que facilita o estudo comparado da obra original e do texto traduzido. Além disso, os livros estão recheados de notas culturais e de notas de tradução, as quais são de grande valia para quem quer entender mais sobre as escolhas que deve fazer um tradutor ao longo do processo tradutório. Por fim, cada conto é seguido de alguns exercícios de compreensão de texto e de uso da língua, todos acompanhados de gabarito.
O primeiro livro lançado foi o dos contos de Mark Twain: os três contos que compõem esse volume são unidos pela temática do dinheiro (e das relações humanas que se estabelecem por causa dele). O segundo livro é o dos contos de M. R. James, que contém seis contos no gênero ghost story.
A série é um ótimo material para quem quer desenvolver a compreensão de texto, a competência lexical e as habilidades de tradução.
Em seu livro Escola de Tradutores, Paulo Rónai define o fenômeno da polissemia como uma “enfermidade da linguagem (que lhe enfraquece a lógica, enquanto a torna apta à expressão poética)”. Rónai fala especificamente sobre a dificuldade de lidar com a polissemia na tradução técnica e dá como exemplo o caso do vocábulo “resistência”, no campo da eletrotécnica: ele será traduzido para a língua inglesa como resistance “quando se tratar da propriedade que têm os condutores elétricos de se opor à passagem de corrente elétrica”, mas como resistor “em se tratando de peça má condutora encaixada num circuito”.
Na tarefa de tradução para a língua portuguesa do CACD 2016, alguns dos erros dos candidatos podem ser atribuídos à polissemia (não percebida) de alguns vocábulos usados no texto fonte. Destaco, neste post, dois casos — as traduções de noise e de language — para que possamos iniciar a reflexão sobre esse tema da polissemia nas tarefas de tradução.
1. Noise
No CACD 2016, o texto fonte da tarefa Translation Part A dizia: “Simply by making noises with our mouths, we can reliably cause precise new combinations of ideas to arise in each other’s minds“. Os candidatos que traduziram noise como “barulho” foram apenados. Mas noise não quer dizer “barulho”?
“Barulho” é um dos sentidos de noise, que é uma palavra polissêmica. Mas, naquele contexto, “barulho” não fazia sentido. Na definição do Dicionário Houaiss, “barulho” é “som estrepitoso; rumor; estrondo”; sabemos, pelo contexto, que não é disso que o autor está falando. Após a interposição de recursos, essa foi, justamente, a justificativa do examinador para o indeferimento: “‘barulho’ é um som estrepitoso, o que não se coaduna com o sentido do original.”
O sentido que se depreende do texto é noise como sound; naquele contexto, noise poderia ser traduzido, portanto, como “som” ou “ruído” (no sentido de “som confuso, indistinto”).
2. Language
O mesmo texto fonte também dizia: “That ability is language.” Os candidatos que traduziram language, aqui, como “língua” foram apenados.
É claro que uma das acepções de languageé “the particular form of words and speech that is used by the people of a country, area or social group“, e, nesse sentido, o vocábulo pode ser traduzido como “língua, idioma”.
Entretanto, o sentido, nesse trecho do texto, não é esse, mas sim de “the method o human communication using spoken or written words“. Nesse sentido, language não quer dizer “língua”, mas sim “linguagem”. A capacidade (“ability“) é a linguagem, não a língua. Na definição do Houaiss, linguagem é “a capacidade inata da espécie humana de aprender e comunicar-se por meio de uma língua (‘sistema’)”.
Contudo, note que, no fim do texto, quando o autor escreve “but what is truly arresting about our kind is better captured in the story of the Tower of Babel, in which humanity, speaking a single language, came so close to reaching heaven that God himself felt threatened“, o sentido de language, aqui, é de “língua, idioma”.
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Pode-se argumentar que, em um sistema semiótico ideal, cada palavra corresponderia a um sentido — ou seja, cada significante corresponderia a apenas um significado. Nos sistemas reais, entretanto, a polissemia é um fenômeno frequentemente observado. Como o próprio Dicionário Houaiss ressalta, “a polissemia é um fenômeno comum nas línguas naturais, são raras as palavras que não a apresentam”.
Alguns autores, inclusive, argumentam que as palavras não têm sentidos mais sim “sentidos em potencial” (meaning potential): as palavras não significam; elas podem significar. E o que tranforma um meaning potential em meaning é o contexto. Assim, é no contexto que o sentido se realiza, se concretiza.
Traduzindo essa discussão mais teórica e abstrata para nossas preocupações mais práticas com a prova: como podemos identificar e desambiguizar as palavras polissêmicas? A chave, aqui, é não traduzir cada palavra isoladamente, mas sempre tendo em mente o texto no qual ela está inserida!
Quando palavras polissêmicas são tiradas do contexto, é normal presumir que seu sentido seja o mais prototípico. Mas isso pode resultar em um erro de interpretação de texto e de tradução. Por exemplo, se eu perguntasse como você traduziria a palavra start, você provavelmente diria “começar, iniciar”. Entretanto, na expressão start the car, o verbo não tem o sentido de “make something begin to happen“, mas sim de “switch on a machine or engine“. Dessa forma, em start the car, start não significa “começar, inciar”.
É só no contexto que podemos avaliar a classe da palavra, o que também contribui para a construção do sentido. Por exemplo, se eu perguntasse como você traduziria a palavra but, é bem provável que você diria “mas”, presumindo que eu estivesse fazendo referência a but como conjunção; mas but também pode ser advérbio (“We can but hope that things will improve“) e até preposição (“There’s been nothing but trouble since he came“). Em nenhum desses dois casos but seria traduzido como “mas”.
As combinações de palavras no contexto selecionam e reforçam seus sentidos. Quando eu falo de um old man, fica claro que old é uma referência a sua idade; quando eu falo de um old friend, a referência costuma ser não à idade do amigo, mas a uma amizade que conservo há muito tempo.
Dessa forma, é só no contexto que podemos entender o sentido de uma palavra polissêmica. Nas palavras de Goran Schmidt, “If we accept the primacy of construction over its parts, we could avoid polysemy at the level of words”.
Dada a frequência do fenômeno da polissemia, é essencial ter muita atenção ao contexto nas tarefas de tradução. Durante o ato tradutório, procure certificar-se de que você entende o sentido das palavras no texto fonte; se algo soa estranho, não culpe o autor do texto: pode ser que você esteja pensando apenas no sentido mais prototípico de uma palavra que também tem sentidos subsidiários.
Além de atenção durante o ato tradutório, é essencial fazer algumas revisões do texto de chegada. E agora que temos cinco horas de prova discursiva, proofreading ficou mais factível ainda! O que sempre sugiro a meus alunos é um proofreading em duas etapas:
na primeira etapa, compare seu texto ao texto fonte para verificar se você não pulou nenhuma unidade de tradução (há casos de candidatos que pulam linhas inteiras!) e para verificar a fidelidade ao texto fonte;
A divulgação dos resultados da prova de terceira fase de língua inglesa se aproxima, e muitos me perguntam sobre a interposição de recursos. Após analisar minuciosamente tanto as provas às quais tive acesso ano passado quanto as respostas da banca examinadora a recursos interpostos, escrevo aqui algumas observações e recomendações no que diz respeito à interposição de recursos na tarefa Translation Part A.
Não use qualquer dicionário
Nas tarefas de tradução, a interposição de recursos depende quase que exclusivamente do uso de dicionários: os recursos mais comuns são aqueles em que o candidato tenta demonstrar para a banca examinadora que sua solução de tradução está correta por meio da citação de definições de dicionários monolíngues, de traduções em dicionários bilíngues, de relações de sinonímia etc. Como qualquer outro tipo de recurso, o recurso com base em dicionários precisa ter como respaldo fontes que sejam consideradas authoritative; a autoridade da fonte torna seu argumento no recurso mais irretorquível.
É aconselhável evitar citar como fontes dicionários simplificados dirigidos a um público estrangeiro, pois, nas palavras da própria banca, eles carecem “de sofisticação lexicográfica por ter como público-alvo aprendizes de inglês”. Assim, evitem citar dicionários escolares (ou learner’s dictionaries), versões abridged de grandes dicionários e recursos online como o The Free Dictionary (esse exemplo em particular foi dado pela própria banca em resposta a um recurso).
Para uma lista de dicionários indicados, sugiro dar uma olhada no Guia de Estudos de 2010 aqui.
Não é porque a sua solução de tradução existe em um dicionário que ela está correta
Ao utilizar dicionários bilíngues em seus recursos, cuidado: você pode ter traduzido uma palavra / unidade de tradução do texto fonte exatamente como sugerido por seu dicionário bilíngue, mas isso não significa que aquela tradução esteja correta naquele contexto.
Explico melhor por meio de um exemplo. Na Translation Part A de 2015, o texto começava assim: “It was once the custom for British ambassadors to write a valedictory despatch at the end of their posting”. De todas as provas que analisei, apenas 3% apresentaram soluções de tradução para despatch que foram aceitas pela banca. Em seus recursos, muitos candidatos argumentaram que “a tradução é considerada correta de acordo com o dicionário xxx”. No entanto, despatch não tinha, de fato, o sentido de “despacho” naquele contexto. Copio aqui uma explicação da banca examinadora:
“O contexto apresentado, aqui, é o de um relatório/comunicado de despedida, uma espécie de balanço final de uma carreira diplomática. Não se trata de um despacho carta oficial ou ofício públicos que um ministro envia a outro. O autor, um diplomata, ao se aposentar, relata fatos alguns deles de natureza jocosa, o que seria inadmissível em um despacho, que vivenciou, expressando opiniões pessoais e, por vezes, nada diplomáticas sobre a população dos países onde serviu. Ademais, tal relatório tem livre circulação entre os funcionários do ministério, o que não ocorreria no caso de despachos.”
Portanto, sempre considere se aquela tradução é pertinente para aquele contexto – em termos de sentido, de naturalidade no idioma de chegada, de ser uma série usual, de respeitar o registro do texto fonte etc. É o contexto que define se uma tradução é adequada ou não, não o dicionário. Ainda nas palavras do examinador:
“dicionários simplesmente arrolam algumas possibilidades de significado de um dado vocábulo, independentemente da existência de um determinado contexto. Tal contexto é que definirá se esse ou aquele vocábulo se adéqua à estrutura morfossintática, à precisão semântica, ao uso etc. da frase em questão. Não se trata, portanto, de mero significado mas de significado naquele contexto específico.”
Por isso, no ato tradutório, é importante que você verifique se:
– compreendeu bem o texto: tradução é, antes de qualquer coisa, interpretação de texto. Certifique-se de que você entende o sentido de cada palavra / unidade de tradução naquele contexto. Pense se a palavra é polissêmica. Dentre as provas às quais tive acesso ano passado, 50% dos candidatos traduziram reviews em “capability reviews” como “revisões”. Review é uma palavra polissêmica, e seu sentido não é de “revisão” naquele contexto, mas sim de “avaliação”.
– sua tradução soa natural em português: correção lexical é um critério de avaliação, e fazer uso de séries usuais em português é algo exigido na prova. É preciso ir além do sentido da cada palavra: o produto final é um texto, e o texto deve ser em português, não em “tradutês”. Na prova de 2015, muitos candidatos (46%, na minha amostragem) tiveram dificuldades com a tradução de render em “the ability to render incisive judgment”. A tradução de render para o português dependia muito da tradução do complemento desse verbo (“judgment”). A banca aceitou traduções como “fazer um julgamento” e “elaborar um julgamento”, mas não aceitou formulações como “entregar um julgamento”– ainda que, em outros contextos, render possa ser traduzido como “entregar”.
– seu texto respeita o registro do texto fonte: esse também é um critério de correção. Tenho um aluno que traduziu wit, no texto de 2015, como “esperteza” e foi apenado. Apesar de argumentar que “esperteza” é sinônimo de “perspicácia” e “sagacidade” (outras traduções que foram aceitas para o termo), a banca respondeu que “o registro não se coaduna com a natureza do texto”.
Dessa forma, no seu recurso, não basta alegar que a tradução consta de um bom dicionário: é preciso demonstrar à banca que ela é adequada ao contexto. Isso pode ser feito, por exemplo, por meio do recurso a outros (con)textos. Tenho um aluno que traduziu, na mesma tarefa, “Whether written with quill” como “Fosse escrito com pena”. Ele foi penalizado (-0,5), como outros candidatos, pelo uso do “com”. Em seu recurso, o candidato alegou que a expressão “com pena” é de uso consagrado na língua portuguesa e citou um trecho que localizou na obra de Machado de Assis. A apenação foi revertida, possivelmente porque o candidato conseguiu demonstrar que a expressão é apropriada (note, também, a autoridade a que recorreu para demonstrar isso).
O recurso à sinonímia *pode* funcionar
Não é raro a banca aceitar alguma solução de tradução após a interposição de um recurso que argumente que a solução utilizada no texto de chegada é sinônima a outras soluções que você já sabe, após ver a correção da prova de colegas, que foram aceitas. Em 2015, um aluno que havia traduzido wit como “sagacidade” foi apenado. Em seu recurso, argumentou que “segundo o Dicionário Houaiss de Sinônimos e Antônimos, ‘sagacidade’ é sinônimo tanto de ‘inteligência’ quanto de ‘perspicácia’”. O recurso foi deferido.
Esse tipo de recurso, entretanto, não necessariamente garante a devolução do ponto, já que, como bem ressalta a banca na resposta a um recurso,
“num dado contexto, palavras sinônimas podem não desempenhar a mesma função e uma pode se adequada e, seu sinônimo, não. A criação de um universo textual, geralmente, inviabiliza a sinonímia absoluta.”
Tendo isso em mente, em seu recurso, não basta destacar a sinonímia: procure demonstrar que a sua solução de tradução não só tem o mesmo sentido que outras que foram aceitas, mas também soa natural, respeita o registro do texto fonte etc.
Citar outras provas *pode* funcionar
Em 2015, alguns candidatos, após estudarem as correções de suas provas e das provas de colegas, notaram grandes disparidades nas correções, no sentido de que algumas soluções de tradução foram aceitas em algumas provas e, em outras, não. Solicitando a permissão dos colegas, ao interpor recursos, alguns candidatos mencionaram que a tradução que na prova deles foi considerada errada fora aceita na “prova de número de máscara xxxxx”. Na maior parte dos casos (na minha amostragem, ao menos) em que esse tipo de argumentação foi usado, o recurso foi deferido. Por exemplo, o único caso em que vi a banca aceitar a tradução “caráter” para character após a interposição de recursos foi justamente em um recurso que citava outras provas nas quais “caráter” havia sido aceito.
No entanto, destaco aqui que 1) não é possível determinar se esses recursos foram deferidos por causa da menção dessas disparidades, já que eles não consistiam tão somente nesse argumento e 2) nem todos os recursos que seguiram essa linha argumentativa foram deferidos.
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A recomendação mais importante para quem vai receber sua prova corrigida na próxima semana é: interponha recursos. Mesmo que você não tenha nenhuma chance de aprovação este ano. Em primeiro lugar, porque essa é uma oportunidade de aprender a interpor recursos (como redigir seus textos, como funciona a plataforma etc.). Em segundo lugar, porque as respostas aos recursos (quando não consistem apenas em “deferido/indeferido”) nos ensinam muito sobre as visões e as expectativas da banca. Por fim, porque avaliar seu desempenho, aprender com seus erros e com os de outros candidatos e entender as posições da banca são formas muito valiosas de começar a se preparar para o próximo CACD!
Dando sequência ao post em que discuti a importância de estudar tradução, não só para as tarefas de tradução da prova de inglês na terceira fase do CACD, mas também como método para incrementar a competência na língua inglesa, hoje escrevo sobre algumas formas de dar início a esses estudos sem a instrução de um professor/tradutor.
Publicações bilíngues
Analise o trabalho de outros tradutores! Isso permite que você reflita sobre as decisões que precisam ser tomadas quando se traduz um texto. Comece por textos curtos, sobre temas que você conhece bem, e vá progredindo para textos mais longos e mais complexos em termos semânticos e sintáticos. No site do Itamaraty, por exemplo, há vários textos em português, como notas e discursos, acompanhados de versões para a língua inglesa.
Para os que já buscam maiores desafios, edições bilíngues de obras literárias são uma ótima opção. Existe uma coleção de livros bilíngues da qual gosto muito, por sua praticidade, publicada pela editora Landmark. A coleção tem títulos clássicos como Dracula, Moby Dick e até nosso querido Orlando, de Virginia Woolf. Essas são boas opções para quem quer estudar o par inglês-português. Para quem deseja estudar o par português-inglês, uma ideia é procurar a versão para o inglês de alguma obra em português que você já leu. Eu gostei de ler, mais recentemente, Barren Lives (versão de Vidas Secas, de Graciliano Ramos), Confession of the Lioness (versão de A Confissão da Leoa, de Mia Couto) e The Hour of the Star (versão de A Hora da Estrela, de Clarice Lispector), por exemplo.
Exercícios de tradução
Practice makes perfect! Além de estudar traduções já prontas, é essencial que você também traduza. Uma obra de referência para translators in training é o Vocabulando Pack, de Isa Mara Lando. O Vocabulando Pack consiste em um dicionário de falsos cognatos e de termos mais complicados de traduzir (por sua polissemia, por exemplo) e um workbook com exercícios de tradução. Recomendo o uso da edição mais nova (capa vermelha), pois está atualizada e mais completa.
Outro exercício recomendado é selecionar um trecho curto de uma publicação bilíngue e, antes de ler a tradução já pronta, tentar, você mesmo, traduzi-lo. Depois, compare seu texto de chegada com o texto do tradutor. É claro que seu texto não precisa ser – e muito provavelmente não será – igual ao do tradutor, até porque, normalmente, há diversas possibilidades de tradução para o mesmo texto. Mas compare os dois textos em termos de precisão semântica e sintática, fidelidade ao texto fonte, naturalidade no idioma de chegada etc. É bem possível que, se você estiver fazendo esse trabalho sem o auxílio de um professor/tradutor, alguns erros ou “pontos a melhorar” passem desapercebidos, mas, ainda assim, há muito a se ganhar com esse exercício! Ele pode ser feito com ou sem apoio externo (dicionários, glossários etc.), dependendo do seu objetivo com esse exercício.
Estudos de Tradução
Estudar teoria da tradução não é um requisito essencial para começar a traduzir. Até historicamente, a prática da tradução precede a teorização em centenas de anos. Mas ter algumas noções teóricas ajuda a tornar o ato tradutório algo mais consciente e crítico – e é claro que isso tem impactos extremamente positivos tanto no processo de aquisição de uma língua estrangeira quanto no próprio produto final do processo de tradução. O que não falta é literatura nessa área de conhecimento. Algumas obras indicadas, para quem se interessar, são Oficina de Tradução, de Rosemary Arrojo, Tradução: Teoria e Prática, de John Milton, Introducing Translation Studies, de Jeremy Munday, e Translation and Translating, de Roger T. Bell.
Não é raro ouvir ou ler comentários de CACDistas sobre como as tarefas de tradução da prova de inglês, na terceira fase, se resumem a uma questão de sorte: ou você tem a sorte de abrir a prova e encontrar um texto recheado de palavras que você conhece, ou não. Essa percepção com alguma frequência serve como justificativa para que uma porção muito pequena – quando não inexistente – do planejamento de estudos de língua inglesa para o concurso seja dedicada a essas tarefas.
É claro que contar com a sorte é algo mais que desejável nessas (e em todas outras!) tarefas, visto que os textos selecionados costumam ser bem complexos e que não é permitido o acesso a nenhum apoio externo. Isso, entretanto, não significa que tradução é sorte e que não há nada que se possa fazer em termos de preparação para essas tarefas. Muito pelo contrário. Neste post, discutirei a importância de dedicar tempo à tradução na preparação para o concurso.
Traduz melhor quem conhece mais palavras.
Um texto não é um aglomerado de palavras meramente justapostas – se fosse, talvez conhecer palavras fosse suficiente para o ato tradutório. Em um texto, as palavras se relacionam de várias formas, em termos tanto semânticos, quanto morfossintáticos, culturais, ideológicos etc. Não traduz melhor quem conhece mais palavras; a tradução depende de vários fatores, como compreender essas relações estabelecidas no texto fonte e ter competência linguística no idioma de chegada. Isso sem contar a discussão sobre o que significa “conhecer uma palavra”, já que uma palavra pode ser polissêmica e ter sentidos que desconheço, ou ela pode ser usada em uma expressão fixa que eu não compreendo, ou, ainda, ela pode ser conhecida apenas “passivamente” (eu entendo seu sentido quando a ouço ou a leio), mas não “ativamente” (eu não sei como usá-la ao falar ou escrever). E daí também a necessidade de se compreender que dicionários bilíngues têm escopo limitado: os verbetes correspondem a palavras e locuções, mas as traduções sugeridas não compreendem todas as possibilidades de contextos nos quais certa palavra ou locução poderia ocorrer (e a tradução depende essencialmente do contexto, já que é nele que estão estabelecidas as relações entre as palavras).
Mas eu falo bem português e inglês…
Ter bons conhecimentos de dois idiomas não significa ser capaz de traduzir de um idioma para o outro. Tenho poucos colegas tradutores que se dedicam a mais de um par linguístico; muitos deles têm excelentes conhecimentos de língua portuguesa e de língua inglesa (e, em alguns casos, de mais idiomas) e, ainda assim, optam por trabalhar ou apenas com tradução de inglês ou apenas com versões para o inglês (sem mencionar que a imensa maioria deles restringe a área de atuação: traduções literárias, área jurídica, tecnologia da informação etc.). Traduzir envolve uma série de conhecimentos, reflexões e decisões que não costumam fazer parte dos processos envolvidos na comunicação em um idioma estrangeiro. Além disso, se pensarmos a tradução como uma habilidade, é preciso praticá-la, e muito, para produzir um resultado satisfatório. Se me permite a comparação, é um pouco como tocar um instrumento musical: eu estudei em conservatório por algum tempo, li algumas obras sobre teoria musical e musicologia e tenho boa percepção musical, mas, como não tive a disciplina de “praticar até a perfeição”, não há muita coisa que eu saiba fazer quando estou na frente de um piano.
Importante mesmo é treinar para a redação!
A redação é, de fato, a tarefa mais importante da prova de inglês da terceira fase, já que só essa tarefa vale 50 pontos em uma prova que vale, no total, 100 pontos. No entanto, isso não quer dizer que os 35 pontos que correspondem às tarefas de tradução possam ser deixados a cargo da sorte. Sabemos que a aprovação no concurso acaba sendo decidida, muitas vezes, por apenas um ponto (quando não por décimos). Além disso, a banca costuma ser composta por professores da área de tradução (como Ofal Fialho e Mark David Ridd, em 2015), o que não garante que não aconteçam problemas nas correções das tarefas, mas ao menos pode ser considerado um indício da importância dessas tarefas na prova – e talvez da importância da tradução de forma mais ampla, como argumentarei a seguir.
Eu quero ser diplomata, não tradutor.
Translation is not the preserve of translators. Há tantas instâncias de nossa vida, pessoal e professional, em que a tradução se faz presente, e muitas vezes de forma inconsciente. E algo que é crucial destacar para os propósitos deste post é que aprender a traduzir de forma consciente e crítica pode ajudar a melhorar a competência em inglês de forma geral.
Vou me deter um pouco nesse argumento, inclusive fazendo referência a um excelente artigo escrito por Mark David Ridd e Maria Carolina Calvo Capilla. Existe algum consenso, entre estudiosos, de que a aprendizagem de uma língua estrangeira (LE) passa pelo filtro de nossa língua materna (L1): com base na L1, elaboramos hipóteses para a aquisição da LE. Nesse processo, podemos identificar transferências e interferências; o conhecimento prévio da L1 pode ser corretamente aplicado na LE, o que auxilia a aquisição da LE (transferência), mas esse conhecimento pode não ser aplicável à LE, o que resulta em erros (interferência).
Muitas vezes, os erros ocasionados por interferências não impedem a comunicação (quem nunca perguntou para o professor de inglês se aquele errinho de preposição realmente impediria que o falante nativo compreendesse sua mensagem?). Assim, ou por falta de necessidade comunicativa de melhorar a competência no idioma, ou por simples falta de percepção da existência das interferências e dos erros, muitos estudantes de LE acabam não conseguindo chegar ao nível de proficiência na LE, atingindo um plateau e ali ficando estacionados em seu processo de aprendizagem. O estudante nessa situação fala uma espécie de interlíngua – no nosso caso, um tipo de “portuglês” – que poder dar conta de diversas situações comunicativas, mas certamente não passa perto do que exames de proficiência e a própria prova de inglês do CACD exigem. E o problema fica pior quando, por não serem corrigidos, esses erros de interferência acabam sendo repetidos e finalmente fossilizados.
Se a L1 é o modelo que inicialmente adotamos quando da aquisição de uma LE, faz muito sentido que esses dois idiomas sejam conscientemente e criticamente contrastados, já que isso pode ajudar a incentivar transferências e a evitar interferências. E o que é a tradução se não uma atividade de confrontação explícita e reflexiva de um par linguístico? Hoje em dia, são muitos os estudiosos, como o próprio Mark David Ridd, que acreditam que a tradução deve ser usada, em cursos de idiomas que têm como base métodos comunicativos, como forma de conscientização das relações em L1 e LE no processo de aprendizagem com o objetivo de facilitar a aprendizagem por transferências, diminuir a ocorrência de interferências, evitar a fossilização de erros e, em última instância, possibilitar que um número maior de estudantes atinja a tão almejada proficiência na LE.
Ok, então se eu entendi direito…
Treinar para as tarefas de tradução é essencial para o CACDista porque não basta comunicar-se bem em português e inglês bem para traduzir bem. Em um concurso em que qualquer meio ponto pode significar ou a posse ou pelo menos mais um ano de estudos, todas as tarefas da prova de inglês são importantes. Além disso, ao treinar para as tarefas de tradução, você perceberá que alguns de seus erros em outras tarefas, como na redação, estão relacionados a interferências da língua portuguesa, e essa consciência crítica é essencial para que você aprimore sua competência em inglês em todas as tarefas da prova de inglês – e, possivelmente, isso terá efeitos positivos no processo de aprendizagem de outras línguas estrangeiras e em contextos de uso desses idiomas que vão muito além do CACD.
No próximo post, discutirei algumas formas de estudar tradução.
No último capítulo do livro Traduzir com autonomia: estratégias para o tradutor em formação, Fábio Alves, um dos coautores, propõe um modelo didático do processo tradutório, no qual ele integra as estratégias de tradução que são discutidas ao longo do livro. Neste post, apresentarei uma adaptação livre do modelo de Alves, pensando especificamente nos recursos estratégicos que de fato estão disponíveis para os cacdistas.
Alves desenvolve seu modelo de processo tradutório partindo do modelo do teórico alemão Frank Könings, o qual divide as atividades de tradução em dois blocos: o Bloco Automático e o Bloco Reflexivo. O Bloco Automático corresponde à primeira etapa do processo tradutório, na qual as Unidades de Tradução (UTs) já têm, para o tradutor, uma equivalência preestabelecida – ou seja, são tradutíveis automaticamente. O Bloco Reflexivo, por sua vez, é a segunda parte do processo, na qual o tradutor precisa recorrer à reflexão para traduzir as UTs restantes.
Considerando esse um modelo simplista, Alves propõe um modelo mais complexo, composto de sete etapas: automatização, bloqueio processual, apoio interno, apoio externo, combinação de apoios interno e externo, priorização e omissão de informações e, finalmente, aperfeiçoamento do texto de chegada. Como o cacdista não pode passar pelas etapas que incluem qualquer apoio externo, por não haver possibilidade de consultas durante a prova, apresento aqui comentários direcionados sobre as etapas propostas por Alves.
Em tradução, sabemos que não existe sempre equivalência um para um entre os itens lexicais dos pares linguísticos – se a equivalência sempre existisse, o processo tradutório se resumiria à substituição de uma palavra do texto de partida por uma palavra equivalente no texto de chegada, e a tradução seria simétrica e reversível. Essas equivalências automáticas, as quais são objeto da primeira fase do modelo de Alves, a Automatização, são, na verdade, uma parcela bem pequena da totalidade das UTs.
Quando o tradutor não encontra uma equivalência automática para uma UT, ele passa a operá-la no que Könings chama de Bloco Reflexivo. Entretanto, se por falta de competência linguística ou tradutória o tradutor não conseguir fazer essa operação, ele chega ao que Alves chama de Bloqueio Processual: nesse caso, o tradutor é levado ou à eliminação da UT do processo tradutório ou até, por vezes, à interrupção de todo o processo.
Para evitar o bloqueio tradutório, é essencial ter consciência das estratégias de tradução, as quais serão usadas no Bloco Reflexivo. Para o cacdista, isso significa estratégias de Apoio Interno, ou seja, “as operações mentais que envolvem os conhecimentos prévios do tradutor”. Nesse sentido, quando o tradutor utiliza como apoio conhecimentos já disponíveis sobre a UT, ele usa a memória; quando ele não tem esses conhecimentos prévios, recorre a mecanismos inferenciais (ver post sobre subsídios internos).
Na etapa de Priorização e Omissão de Informações, o tradutor toma decisões inter-relacionando texto, língua de partida e língua de chegada. Nessa etapa, o tradutor se questiona, por exemplo, sobre questões culturais e idiomáticas. Alves dá exemplos bastante elucidativos, mencionando algumas soluções de tradução para a seguinte frase:
“Sixteen years had Miss Taylor been in Mr Woodhouse’s family, less a governess than a friend.”
Alves conta que um tradutor optou por traduzir less a governess than a friend como “mais como amiga que como governanta”, para que o texto de chegada ficasse mais compreensível; outro preferiu traduzir Miss como “Dona”, e não como “Senhorita”, fazendo assim uma adequação do título, pensando na possível idade da personagem – e na consistência do texto de chegada.
Na etapa final, de Aperfeiçoamento do Texto de Chegada, o processo tradutório é revisado e as UTs consideradas insatisfatórias são aperfeiçoadas.
Preocupado com a didática da tradução e em oferecer uma opção metodológica para o treinamento de tradutores, a qual tivesse como base uma abordagem cognitiva, Alves propõe um modelo de processo tradutório. O modelo de Alves pode ser visualizado clicando aqui, porém proponho neste post um modelo livremente adaptado, tendo em mente especificamente as etapas que um cacdista pode percorrer na terceira fase:
Modelo livremente adaptado para Cacdistas
Assim como no modelo de Alves, aqui os retângulos são etapas do processo tradutório, enquanto que os losangos são momentos de tomada de decisão – por isso estão acompanhados pelas alternativas “sim” ou “não”. Após a tomada da decisão, a seta indica a continuidade do processo.
Dou um exemplo de passos em um processo tradutório segundo esse modelo. Primeiramente, o candidato escolhe a UT que pretende traduzir. Então, pergunta-se se pode operá-la no Bloco Automático – ou seja, se a UT pode ser automaticamente traduzida, sem reflexão. Se sim, a tradução é efetuada e passa-se à próxima UT. Se não, passa a operá-la no Bloco Reflexivo. Se ela se encontrar em sua memória de longo prazo, a tradução é efetuada e passa-se à próxima UT; se não, o candidato tentará processar inferências locais e globais para tentar chegar a uma solução de tradução. Se chegar a uma solução, a tradução é efetuada e passa-se à próxima UT. Se não, o processo tradutório fica bloqueado até que a UT seja eliminada – ou brevemente deixada de lado (pode ser que a continuidade do texto ajude a recuperar a memória de longo prazo ou mesmo a processar inferências). No caso da possibilidade de uma solução de tradução, a UT é traduzida em um texto de chegada provisório – provisório porque não está completo e porque, após a tradução da totalidade das UTs, passará pelos processos de priorização e omissão de informações e de aperfeiçoamento.
É claro que esse modelo não tem a intenção, como ressalta Alves, de ser uma descrição de como se dá o processo tradutório em termos piscolinguísticos; a ideia é apresentar alguns possíveis caminhos que podem percorrer um tradutor em formação. Apesar de, da forma como está descrito, esse processo parecer ser longo e complexo demais para tarefas que os cacdistas normalmente procuram concluir em menos de uma hora, muitas dessas operações são realizadas quase que instantaneamente, principalmente por candidatos com um pouco mais de experiência em tradução. Assim, o modelo permite visualizar de forma organizada os processos psicolinguísticos envolvidos no processo tradutório, os quais podem ser desenvolvidos com exercícios de tradução e devem ser usados conscientemente nas tarefas da terceira fase.
Além da delimitação consciente das Unidades de Tradução, outra estratégia que pode ser útil ao cacdista nas tarefas de tradução e versão na prova de inglês da terceira fase é o uso, também consciente, de subsídios internos, especialmente porque não é permitido o recurso a subsídios externos, como dicionários bilíngues em geral, textos paralelos ou glossários especializados. Neste post, continuarei reportando à discussão proposta por Fábio Alves no livro Traduzir com autonomia: estratégias para o tradutor em formação, no qual ele fala sobre dois subsídios internos: a memória e as inferências.
No que diz respeito à memória, Alves afirma que ela tem três funções principais: armazenar informações, recuperar informações armazenadas e esquecer informações. A melhor forma de armazenar informações é através do estabelecimento de associações, o que pode acontecer ou por contiguidade, ou por frequência. Isso quer dizer que as melhores formas de armazenamento de informação são por meio do inter-relacionamento de informações (contiguidade) e pela repetição do registro (frequência). Assim, a capacidade de recuperar as informações armazenadas depende, ao menos em parte, da elaboração de uma rede de informações associativa.
Quanto à recuperação da informação, Alves explica que a memória tem duas fases: a memória de curto prazo e a de longo prazo. A memória de curto prazo, a qual inclui a memória visual, é aquela processada quase instantaneamente: ela está sempre disponível e o acesso a ela ocorre quase que de forma inconsciente. Alves dá o exemplo das palavras house, car e dog, as quais, se nos apoiarmos na memória de curto prazo, não teremos dificuldades para traduzir de forma praticamente automática. Entretanto, esses automatismos são perigosos no processo tradutório, já que a tradução requer reflexão consciente. No caso da palavra dog, por exemplo, traduzi-la como cachorro na frase it is raining cats and dogs poderia ser visto como não idiomático. Por isso, Alves argumenta que o processo tradutório se beneficia mais do apoio da memória de longo prazo, a qual ele define como “forma estável de codificação de informações que nos permite sua recuperação consciente por intermédio das redes associativas”. Para Alves, quanto maior o número de associações, maior a capacidade de recuperar a memória. Para ilustrar o que seriam essas redes associativas, Alves apresenta este mapa conceitual:
“Traduzir com autonomia”, p. 63.
Além da memória, há outro mecanismo cognitivo que funciona como subsídio interno no processo tradutório: a capacidade de produzir e processar inferências. Inferir é obter informações que não estão disponíveis de forma direta, e as inferências podem ser de caráter local ou global. Inferências locais são raciocínios dedutivos possibilitados pelo caráter coesivo do texto. Por exemplo, no diálogo “A: Have you seen Peter? B: He has gone home”, se a frase He has gone home estivesse sozinha, não poderíamos concluir que foi Peter que foi para casa; entretanto, a inferência é possível com as duas frases, devido ao caráter coesivo de he.
Inferências globais, por sua vez, são aquelas que dependem da percepção de relações que vão além das de coerência, dependendo muitas vezes do conhecimento de mundo, por parte do tradutor. Por exemplo, veja a seguinte frase, tirada de um texto com o qual normalmente trabalho com meus alunos:
“It would go to quartering Redcoats to keep away marauding Indians, or to inhibit revengeful ‘Frogs.'”
A compreensão e a tradução desse trecho dependem de inferências globais, já que o tradutor precisaria ter o conhecimento de mundo de que Redcoats (“Casacas Vermelhas”) era o nome dado aos soldados britânicos e de que Frogs é um ethnic slur para “franceses”.
Ter consciência desses recursos de apoio interno é importante para evitar, na terceira fase, problemas tradutórios diversos, como automatismos inapropriados ou mesmo um bloqueio processual. No próximo post, pretendo comentar o capítulo final do livro Traduzir com autonomia, no qual Alves propõe um modelo didático para o processo tradutório, integrando as estratégias de tradução que vimos nesse post e no anterior, ou seja, a delimitação das Unidades de Tradução e o recurso consciente a mecanismos de apoio interno.
Cheers!
Referências:
PAGANO, A.; MAGALHÃES, C.; ALVES, F. Traduzir com autonomia: estratégias para o tradutor em formação. São Paulo: Contexto, 2011.
Uma das estratégias que podem ser úteis para as tarefas da tradução e da versão na terceira fase do CACD é a delimitação consciente das Unidades de Tradução dos textos de partida. Ao menos é isso que nos leva a crer o argumento de Fábio Alves, coautor do livro Traduzir com autonomia: estratégias para o tradutor em formação, cuja proposta é discutir estratégias de tradução que possibilitam a resolução de problemas tradutórios, partindo do pressuposto que o tradutor deve ter consciência das decisões que toma ao longo do complexo processo tradutório.
Mesmo que apenas intuitivamente, sabemos que a tradução de um texto se dá por partes (não necessariamente sequenciais), as quais podem ser chamadas de Unidades de Tradução (UTs). Um dos maiores desafios do processo tradutório é delimitar as UTs, sendo que às vezes uma UT corresponde a uma palavra, porém tantas outras vezes uma UT corresponde a um sintagma, uma frase, uma oração ou um período.
Para dar um exemplo de o que são UTs e como delimitá-las, cito uma frase de um texto do Traduzir com autonomia:
“Vistors who want to see how many of Brazil’s citizens live can now add the Morro da Previdência favela to their tourism itinerary.”
Pensando em termos de UTs, é interessante notar, conforme destaca Alves, a questão de que how many, normalmente um pronome interrogativo, aqui compõe duas UTs distintas: o sentido aqui não é de “quantos”, mas sim de “como” e “muitos”.
Outro trecho do mesmo texto diz:
“Six local teenagers will act as guides, showing off such sites as the Nossa Senhora da Penha Chapel […].”
Aqui, Alves destaca que show off compõe uma única UT, a qual tem o sentido diferente do de apenas show.
Há casos, por exemplo expressões idiomáticas e provérbios, em que a UT é bem mais extensa:
“A bird in the hand is worth two in the bush.”
Como provérbios não podem ser interpretados literalmente, é preciso traduzi-los de acordo com seu significado, pensando inclusive se há algum provérbio na língua de chegada que seja correspondente. Nesse caso, uma tradução possível seria “Mais vale um pássaro na mão do que dois voando”.
Também cito um exemplo tirado de um texto com o qual eu geralmente trabalho com meus alunos:
“Why not, then, have the colonists, who had been rescued from the wicked French, pay something for their own protection?”
Perceber “have the colonists _____ pay” como uma UT pode ajudar, nesse caso, a não perder de vista o fato de que essa é uma pergunta na causative form. A tradução dessa UT seria algo como “fazer com que os colonos _____ pagassem”.
Vale destacar que a delimitação das UTs não é algo objetivo. Como Alves ressalta, “as estratégias de tradução têm características predominantemente individuais”, ou seja, a delimitação das UTs de um texto de partida é subjetiva. É importante, por isso, que no ato tradutório sejamos conscientes das escolhas que fazemos, já que, ainda segundo Alves, “a delimitação das UTs é o ponto de partida para uma boa tradução”.
Termino este post com o conceito de UT elaborado por Alves:
“Unidade de tradução é um segmento do texto de partida, independente de tamanho e forma específicos, para o qual, em um dado momento, se dirige o foco de atenção do tradutor. Trata-se de um segmento em constante transformação que se modifica segundo as necessidades cognitivas e processuais do tradutor. A unidade de tradução pode ser considerada como a base cognitiva e o ponto de partida para todo o trabalho processual do tradutor. Suas características individuais de delimitação e sua extrema mutabilidade contribuem fundamentalmente para que os textos de chegada tenham formas individualizadas e diferenciadas. O foco de atenção e consciência é o fator direcionador e delimitador da unidade de tradução e é através dele que ela se torna momentaneamente perceptível.”
Cheers!
Referências:
PAGANO, A.; MAGALHÃES, C.; ALVES, F. Traduzir com autonomia: estratégias para o tradutor em formação. São Paulo: Contexto, 2011.
As tarefas da tradução e da versão, na terceira fase do exame, preocupam muitos candidatos, já que elas exigem não só conhecimentos avançados tanto do inglês quanto do português, mas também habilidades avançadas de tradução, algo que normalmente não desenvolvemos quando aprendemos o inglês como língua estrangeira – principalmente em cursos comunicativos. Talvez a maior preocupação de muitos candidatos seja a tênue linha que separa a fidedignidade ao texto fonte e a naturalidade no idioma alvo – os quais são critérios de correção, conforme os Guias de Estudos. Essa é uma preocupação legítima – e inclusive compartilhada por uma comunidade mais ampla de tradutores -, porém não podemos confundir fidedignidade da tradução com literalidade da tradução. A tradução literal é um procedimento de tradução que, quando usado corretamente, de fato permite que uma tradução seja considerada fidedigna, porém ela é apenas um procedimento, dentre tantos outros, e como tal precisa ser usada de forma crítica. O objetivo deste post é fazer um rápido apanhado de procedimentos de tradução, pensando especificamente nos procedimentos conhecidamente aceitos pela banca examinadora do CACD, e assim propor uma reflexão sobre a questão da fidedignidade ao texto fonte.
O último Guia de Estudos do CACD que trouxe uma seção de “bibliografia sugerida” para as provas de inglês foi o de 2010. A bibliografia foi apresentada em cinco subseções: jornais e revistas, dicionários de inglês, dicionários inglês-português e português inglês, gramáticas, e outras fontes. É interessante notar nessa lista que o único material que aborda questões metodológicas e conceituais relacionadas às tarefas da tradução e da versão – e que curiosamente está na subseção de gramática – é o Guia Prático de Tradução Inglesa, escrito pelo diplomata aposentado Agenor Soares dos Santos.
Guia Prático de Tradução Inglesa, edição de 1981
O Guia Prático foi publicado pela primeira vez em 1981 pela editora Cultrix e foi reimpresso diversas vezes e por muitos anos sem qualquer alteração. Apesar de o Guia de Estudos fazer referência específica a essa edição da obra, o Guia Prático foi publicado novamente em 2007, porém em uma edição revisada, ampliada e atualizada, pela editora Campus/Elsevier. O livro ganhou um novo subtítulo (o da primeira edição era comparação semântica e estilística entre os cognatos de sentido diferente em inglês e português e o da nova edição é como evitar as armadilhas das falsas semelhanças), porém o próprio autor adverte, no capítulo de apresentação da nova edição, que o objetivo, as linhas gerais e a área de estudos tratada deste trabalho e do anterior são próximos. O autor esclarece, em termos de diferenças entre os dois trabalhos, que “naquele livro [a edição antiga] não se encontrariam, porém, a abordagem, o volume e a melhor qualidade do material pesquisado e utilizado, o grande número de temas novos e o índice de autores mencionados”.
Guia Prático de Tradução Inglesa, edição de 2007
O livro é sem dúvida uma obra de fôlego e é aparentemente muito referenciado entre tradutores profissionais. Ele é divido em quatro partes, sendo que a segunda delas é o centro da obra: um dicionário de faux amis, ou seja, de cognatos com um ou mais sentidos diferentes na tradução do inglês para o português. São mais de 700 páginas de estudos detalhados do que o autor chama de “cognatos enganadores”, como o que vemos abaixo:
Verbete “dispatch” da edição de 2007
Essa Parte 2 do livro já seria um motivo mais do que suficiente para um candidato que vai fazer o CACD se interessar pela obra, porém me interessa aqui particularmente a Parte 1 do livro. Essa parte é denominada Conceituação e outros estudos, e nela o autor faz diversas considerações de interesse para quem, seja por motivos profissionais seja por outros motivos, está preocupado com questões técnicas e metodológicas no que diz respeito ao ato tradutório. Suponho que isso seja de algum interesse para candidatos que farão o concurso, já que se esse é o único livro da lista de bibliografia sugerida para as provas de inglês que traz reflexões técnico-metodológicas sobre tradução, não parece ser uma hipótese improvável que a visão da banca examinadora sobre as tarefas de tradução e versão esteja, se não totalmente, ao menos em grande medida informada pelos posicionamentos de Agenor Soares dos Santos nessa Parte 1 do livro.
Nesse sentido, o que mais interessa nessa parte do livro é uma seção chamada concepção, objetivos e metodologia do dicionário, e mais especificamente a parte em que ele trata de procedimentos de tradução. A maior referência para o autor nessa seção parece ser a obra Stylistique Comparée du Français et de L’Anglais, de Vinay e Darbelnet, publicada em 1958 (e em 1995 na edição americana Comparative Stylistics of French and English). Trata-se de um clássico da teoria da tradução, o qual teve ampla recepção no Brasil. De acordo com Francis H. Aubert (um dos maiores nomes da tradutologia no Brasil – usarei livremente neste post alguns dos exemplos que ele menciona em um artigo), nessa obra, Vinay e Darbelnet propuseram procedimentos técnicos de tradução que tinham o objetivo inicial de servir como referência didática para o treinamento de tradutores.
Vinay e Darbelnet preveem nesse livro sete métodos de tradução, os quais estão agrupados em duas categorias abrangentes: a tradução direta e a tradução oblíqua. A tradução direta seria a opção do tradutor quando é possível transpor elemento por elemento da língua fonte para a língua alvo, devido à existência de um paralelismo estrutural e metalinguístico entre os dois idiomas. Por sua vez, quando há diferenças estruturais ou metalinguísticas entre as duas línguas e não é possível fazer a transposição sem mexer na estrutura sintática ou mesmo no léxico, temos a tradução oblíqua.
Há três métodos associados à tradução direta: a tradução literal, o empréstimo e o decalque. A tradução literal é o que também chamamos de word-for-word translation; ou seja, quando comparamos dado segmento do texto fonte com o texto alvo, encontramos o mesmo número de palavras, na mesma ordem sintática, empregando as mesmas classes de palavras, e a escolha de sinônimos lexicais. Um exemplo seria traduzir her name is Mary por seu nome é Maria. O empréstimo, por sua vez, é usado quando há alguma lacuna metalinguística (por exemplo uma técnica ou um conceito desconhecido na língua alvo). Nesses casos, o segmento do texto fonte é simplesmente reproduzido no texto alvo – às vezes em itálico, em negrito, entre aspas, ou mesmo sem marcadores. É o caso, por exemplo, de milk shake ou software. Já o decalque é um tipo especial de empréstimo, no qual uma língua empresta uma expressão de outra ou com adaptações ortográficas ou traduzindo literalmente cada um de seus elementos. Podemos pensar como exemplos as palavras sky scraper e abat-jour, do inglês e do francês respectivamente, que em português são traduzidos como arranha-céu e abajur.
Quanto à tradução oblíqua, podemos falar em quatro métodos: transposição, modulação, equivalência e adaptação. A transposição consiste em, de alguma forma, não observar algum critério da tradução literal, rearranjando morfossintaticamente o texto. Isso acontece, por exemplo, quando duas palavras são transformadas em uma (I bought = Comprei), ou uma palavra é expandida em mais de uma unidade lexical (Kindergarten = Jardim de infância), quando há qualquer alteração na ordem das palavras (blue car = carro azul), ou quando há mudança em classes de palavras (should he arrive late = se ele chegar atrasado). Assim, mesmo que os significados sejam traduzidos literalmente, se não há uma literalidade estrutural, trata-se de uma transposição – e é claro que a transposição é em muitos casos obrigatória devido à estrutura morfossintática da língua alvo. A modulação, por sua vez, é a tradução de um segmento de texto com uma mudança evidente da estrutura semântica, porém com a manutenção do significado geral do segmento. É, por exemplo, traduzir it is very difficult como não é fácil ou he acted at once como ele não hesitou. Já as equivalências são casos mais radicais de modulação, muito comuns, por exemplo, para expressões idiomáticas, ditos populares etc. É o caso de traduzir it’s raining cats and dogs por está chovendo canivete ou better lose the saddle than the horse como antes um pássaro na mão que dois voando. Por fim, a adaptação é um procedimento cultural assimilativo, no qual o ato tradutório se satisfaz com o estabelecimento parcial de uma equivalência de sentido. É como, por exemplo, traduzir sheriff como delegado. Se a tradução literal e o empréstimo são as modalidades de tradução que mais guardam proximidade do segmento original com o segmento traduzido, a adaptação está no outro extremo, sendo considerado o limite da tradução.
Feito esse rápido e superficial apanhado dos procedimentos de tradução de Vinay e Darbelnet, é interessante notarmos a leitura que Agenor Soares dos Santos faz deles no Guia Prático. Para ele, “uma das melhores metodologias para a formação do tradutor de inglês” é a transposição. Ele diz que esse é o “mais comum e mais simples procedimento” e que ele mesmo faz uso desse procedimento em mais de 400 verbetes de seu dicionário de cognatos enganadores. O autor também declara fazer uso de modulações, equivalências (especificamente nos casos de clichês, metáforas, frases idiomáticas, provérbios, máximas e ditos), decalques e empréstimos. Assim, os únicos procedimentos que ele não menciona são a tradução literal e a adaptação, porém é possível que esses procedimentos não tenham sido mencionados devido ao escopo “limitado” de seu dicionário – trata-se, afinal, de um dicionário de cognatos enganadores. O que interessa notar é que, diferente do que muitos candidatos possam pensar – ou ter ouvido falar –, a utilização de procedimentos que não a tradução literal não necessariamente leva a uma falta de fidedignidade ao texto fonte. Muito pelo contrário: como vimos, alguns procedimentos como a transposição e a modulação são muitas vezes obrigatórios devido à estrutura morfossintática do idioma alvo e outros se fazem necessários para transpor diferenças metalinguísticas. Isso é o que o único livro sobre tradução no Guia de Estudos do CACD diz, e é o que parece de fato informar os examinadores quando da correção da tradução e da versão.
Dou aqui alguns exemplos de procedimentos de tradução aceitos pela banca examinadora na Tradução A de 2012. Os exemplos são tirados de espelhos aos quais tive acesso após a correção da banca. Começando pela tradução direta, vejamos alguns exemplos de tradução literal:
Exemplo 1
Texto fonte: being snubbed and rebuffed in its quest for trade
Sugestão de tradução aceita: sendo esnobado e contrariado em sua busca por comércio
Exemplo 2
Texto fonte: not their goods, not their ideas, and definitely not their company
Sugestão de tradução aceita: nem seus produtos, nem suas ideias, e definitivamente nem sua companhia
Dentre os espelhos a que tive acesso, encontrei um caso de empréstimo aceito pela banca:
Exemplo 3
Texto fonte: premium Bengal-grown opium
Sugestão de tradução aceita: ópio “premium” plantado em Bengala
Não encontrei casos de decalque – nem aceitos, nem recusados-, mas isso provavelmente se deva ao texto fonte em si, o qual não parece, ao menos em primeira análise, trazer segmentos que pudessem ser objeto de tal procedimento.
Passando à tradução oblíqua, há diversos exemplos de transposição:
Exemplo 4
Texto fonte: an inglorious episode
Sugestão de tradução aceita: um episódio inglório
Exemplo 5
Texto fonte: the British gunboats arrived
Sugestão de tradução aceita: os barcos armados britânicos chegaram
Também temos diversos exemplos de modulação:
Exemplo 6
Texto fonte: there was nothing
Sugestão de tradução aceita: não havia nada
Exemplo 7
Texto fonte: a full 14 tonnes of the narcotic
Sugestão de tradução aceita: 14 toneladas completas do narcótico
Cito aqui também alguns exemplos de equivalências:
Exemplo 8
Texto fonte: the crown would make good their losses
Sugestão de tradução aceita: a coroa cobriria as suas perdas
Exemplo 9
Texto fonte: played their part
Sugestão de tradução aceita: fez o seu papel
Não encontrei casos de adaptação – nem aceitos, nem recusados -, mas isso também é provavelmente devido ao texto fonte.
Assim, concluímos que a tradução não precisa – e muitas vezes não deve – ser literal para ser considerada fidedigna. A opção consciente por outros procedimentos de tradução podem, inclusive, tornar o texto traduzido não só mais natural na língua alvo, mas também mais fidedigno ao texto fonte.