Durante muito tempo, pelo menos até o final do século 19, a tradução foi usada como principal método de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras. O Grammar-Translation Method preconizava que a aquisição de uma língua estrangeira se dava pelo estudo detalhado de suas estruturas gramaticais e pela aplicação dessas estruturas em exercícios de tradução da e para a língua estrangeira.

No século 20, conforme o foco da aprendizagem de idiomas foi passando das habilidades de compreensão e produção escrita para as habilidades de compreensão e produção oral, surgiu um novo método de ensino de idiomas. O Direct Method se contrapunha diretamente ao uso, em situações de aprendizagem de uma língua estrangeira, tanto da língua materna do aprendiz quanto de exercícios de tradução. 

Já em meados do século 20, o Direct Method passou a ser questionado, e muitas novas abordagens surgiram, como o Natural Approach e o Communicative Language Teaching (CLT). Essas novas abordagens preconizam o uso da língua estrangeira em situações de aprendizagem através de tarefas autênticas e interativas. A tradução, nessas abordagens, não é necessariamente proibida, mas também não é o foco, que é a proficiência na comunicação oral.

Nas abordagens que surgiram desde então, muitas delas como variações do próprio CLT, a tradução tem sido retomada, de formas diversas, como método de aprendizagem. Veja algumas das vantagens do uso da tradução como método de aprendizagem de idiomas:

Tradução como “scaffolding”

Mesmo em contextos comunicativos, a tradução pode ser usada para aproveitar os conhecimentos linguísticos prévios do aprendiz (sobre sua língua materna) para a aquisição de novos conhecimentos linguísticos (sobre a língua estrangeira). Essa técnica pode ser particularmente útil quando o aprendiz está no início da aquisição da língua estrangeira.

Tradução como análise contrastiva

Não só os aprendizes em níveis básicos têm a ganhar com a tradução pedagógica: mesmo entre aprendizes com conhecimentos avançados da língua estrangeira, a tradução pode ser usada para conscientizar o aprendiz dos contrastes entre os idiomas (língua materna e língua estrangeira), assim minimizando as interferências da língua materna na aquisição da língua estrangeira e muitas vezes até evitando fossilizações. 

Tradução e aquisição de vocabulário

A tradução pedagógica também é uma ótima forma de promover a aquisição de vocabulário. Ao traduzir diferentes tipos de texto, o aprendiz faz uso de itens lexicais que, caso trabalhasse apenas em textos produzidos por si mesmo, talvez nunca viesse a aprender. 

Tradução e competência instrumental

O uso de exercícios de tradução, mesmo em contextos comunicativos, pode ajudar a desenvolver a competência instrumental dos aprendizes, através do uso consciente de dicionários bilíngues, monolíngues e especializados, além de glossários e corpora. Isso contribui para ganhos linguísticos diversos, além de contribuir para a maior autonomia do aprendiz em seus estudos da língua estrangeira.

Tradução e plurilinguismo

No mundo globalizado, a comunicação multilíngue é uma realidade: cada vez mais, vemos a necessidade, inclusive no mundo profissional, de pessoas que saibam não só se comunicar em mais de um idioma, mas também mediar entre esses idiomas. O próprio Quando Comum Europeu de Referência para Línguas (CEFR), elaborado pelo Conselho da Europa, afirma que o objetivo do aprendiz de línguas estrangeiras deve ser o plurilinguismo e a intercultura. O aprendiz deve ser capaz de “mediate, through interpretation and translation, between speakers of the two languages”. 

Tradução, a quinta habilidade!

Por muito tempo deixada de fora da sala de aula, na qual se trabalhavam “as quatro habilidades” (speaking, listening, reading e writing), a tradução pode ser vista como a quinta habilidade a ser desenvolvia. De acordo com Pym et al., a tradução é “a fifth skill to be practised within the language classroom, alongside reading, listening, speaking and writing in the two languages independently”. Assim, a aquisição de uma língua estrangeira, para além da fala, da escuta, da leitura e da escrita, também pode se dar pela tradução. Para Pym et al., “translation is somehow inherent in the language-learning process itself; […] it is a skill that is as fundamental to the bilingual mind as each of the other skills is to monolingual and bilingual minds alike. In this view, translation is a way (or set of ways) of learning a second or foreign language, and not just a way of training professional translators and interpreters”.

Referências 

CALVO CAPILLA; RIDD. A tradução como atividade contrastava e de conscientização na aprendizagem de línguas próximas. Horizontes de linguística aplicada, v. 8, n. 2, p. 1501-69, 2009.

COUNCIL OF EUROPE. Common European Framework of Reference for Languages: Learning, Teaching, Assessment. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.

PYM, Anthony; MALMKJAER, Kirsten; GUTIERREZ-COLON PLANA, Mar. Translation and language learning: the role of translation in the teaching of languages in the European Union. A study. Luxembourg: Publications Office of the European Union, 2013.

RICHARDS, J.; RODGERS, T. Approaches and methods in language teaching. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.